quarta-feira, 19 de março de 2008

Parte I

Fazia calor como sempre. E a cabeça, que se encostava no travasseiro quente, não abrigava pensamentos outros que a decepção. Mas de certa forma, não era só isso. Decepção, na vida adulta, se transforma em entendimento. E entender as coisas, de vez em quando, dói.
A irritação causava dor de cabeça. Uma dor de cabeça que aumentava com os pensamentos e o sentimento ímpar de nada mais poder fazer.
As pessoas mudam. E, na maioria das vezes, querem ser o que não são. Esbanjam um capital cultural que não possuem, vindo de um habitus inexistente. E pregam verdades que não são as suas.
Pensava: que triste.
Mas é assim.
É assim que essa gente, que só existe virtualmente, atua. Era de fato desolador. Mais ainda quando lembrava das piadas e comentários feitos acerca de pessoas simples, essas que não tiveram acesso a boa cultura. Mas que também não forjam nenhuma outra identidade. Era (indigesto, seria a palavra), que uma pessoa saísse repetindo as idéias e os gostos de amigos próximos, escrevendo coisas tão familiares a seus olhos que até pareciam idéias suas. Que, por ter o privilégio de conhecer meia dúzia de filmes menos populares, e de ter lido no mural da faculdade uma letra de Francis Hime ou Edu Lobo, que por roubar impressãoes sobre a política, demosntrasse por aí uma bagagem cultural inexistente.
Pensou ainda que os livros são alimento cósmico. E riu sozinho, quando lembrou de que muitas páginas foram deixadas pra trás pelo ser indigesto em questão. E lembrou dos políticos, que muitas vezes, mesmo sem cultura nenhuma, encantam pelo belo discurso (decorado e ensaiado). Talvez seja mesmo a retórica diferente aqui. E pensou então, que era mais uma vertente da nossa malandragem típica. Parou de se preocupar: tudo o que tem essência artificial, padece.
Fechou o livro, afofou o travesseiro quente. E lembrou de uma frase muito repetida por sua mãe: você pode enganar alguns durante algum tempo. Não todo mundo o tempo todo.

2 comentários:

Anônimo disse...

É, a mais pura verdade. O que mais encontramos no círculo acadêmico sao esses tipos: vegetarianos maria-vai-com-as-outras, revolucionarios de fim de semana, comunistas de araque e gente que só lembra das citações carne-de-vaca dos livros que acham que entenderam.
Vá checar as conclusoes desses auto-declarados "literatos" sobre livros. Sao todas conclusoes que outra pessoa tirou e eles se apropriaram. Tudo bem certinho, pra nao assustar ninguém do círculo cabeçudo. Afinal....nao queremos ofender quem dá os churrascos e trazem a erva né?

Ser inteligente é uma coisa. ACHAR que é inteligente é outra bem diferente: é ESTUPIDEZ.

Michele disse...

hehe, deveríamos criar uma comunidade pra isso...tipo aquela eu tenho uma amigo forrest gump sabe hehe...
Eu tô meio cansada de me decepcionar com pessoas q achava serem uma coisa e na verdade não são...decepção dá no saco né...